quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Filosofia Joyceana - Experimento de fluxo da consciência sobre uma teoria da mente

Pensar sobre meus pensamentos é uma atividade complexa e cheia de consequências porque ela é infinitamente redundante. Eu estou escrevendo essas linhas exatamente como as estou pensando mas isso obviamente não acontece assim. Não é nunca exatamente como eu as estou pensando, por mais que eu me esforce, porque eu estou sempre pensando sobre o que estou pensando, e penso mais rápido do que escrevo então estou sempre voltando um pouco e além de voltar um pouco também projeto um pouco, projeto um bom tanto na verdade porque algum conteúdo imagético de tudo o que será escrito pensado já toma alguma forma mesmo enquanto estou no presente escrevendo este passado. E agora parei para pensar no que escrever a seguir, então vê, já não é exatamente o que eu penso. Estou consciente de que estou pensando o que estou pensando, ou digamos, eu posso afirmar que acredito que estou pensando o que estou pensando. E acredito que estou pensando que estou pensando o que estou pensando e posso afirmar isso indefinidamente. Acho que tem duas saídas para isso. Uma é postular que apenas essa afirmação de que posso pensar sobre meus pensamentos é o que me faz consciente (Rosenthal) ou que se todas as afirmações secundárias, terciárias, e adiante, sobre pensar o que estou pensando parecem redundantes, pouco reais, então talvez a primária também seja. Talvez afirmar que eu sei que estou pensando seja irreal, apenas redundância, e que ser consciente é simplesmente ter esse fluxo de pensamentos, seja qual for seu conteúdo, sobre o mundo ou sobre meus pensamentos, representação ou reflexão, tudo é apenas o meu fluxo de consciência, como na "joycean machine" de Daniel Dennett: a consciência pode ser apenas um fluxo incessante de perceptos, como o estilo literário explorado por Joyce, Svevo e Faulkner, por exemplo. Ser consciente de mim mesmo pode não significar nada?
O filósofo australiano David Chalmers cunhou o termo "the hard problem". Australiano, parece tão estranho um filósofo australiano, e cheque-o no Google images, com seu cabelo de roqueiro anos 80 e jaqueta de couro, eu posso vê-lo saindo da universidade em uma harley, ou matutando fazendo filosofia de poltrona em uma poltrona impregnada de cheiro de cânhamo queimado, não ajuda nada quando temos que acreditar em sua espécie de dualismo, mas enfim. Hard problem é afirmar que resolver todos os problemas funcionais não resolve o problema da consciência, seja, descrever um modelo detalhado e neuroanatomicofisiologicofuncionalmente perfeito ainda assim não daria conta de explicar como é ser eu. Pode explicar tudo o que eu faço, mas não como é ser eu. Da mesma forma que conhecer exata e perfeitamente o funcionamento sensorial de um morcego não me ajudará jamais a saber como é ser um morcego. Ou como a pobre Mary, provavelmente a segunda Mary fictícia mais comentada do mundo, a fisiologista de cores que sabe tudo o que há para saber sobre a física e a neurofisiologia da percepção de cores mas foi criada desde a infância em um laboratório completamente em branco e preto e quando exposta ao vermelho pela primeira vez, será que ela aprende algo novo? A experiência de como é ver vermelho será algo novo, ou ela já sabe tudo o que há para saber sobre o vermelho? Se houver algo novo, que raios? The hard problem. Chalmers acha que saber como é ser algo ("qualia" é o nome que os filósofos dão para saber como é ser algo), é algo. Existe. É diferente da soma das funções. Diz que defende um certo dualismo, "property dualism", como em: existe uma só coisa mas uma propriedade dessa coisa é matéria e o mundo físico e outra é mente e consciência. Se não fosse a cabeleira... Mas quem surpreendentemente defende um "property dualism" e não tem cabeleira do Scorpions é Cristof Koch, e ele colaborou com Watson Crick que não se chamava Watson, pobre Francis, mas é aquele Crick mesmo, o do Watson, como dizem, você só pode se dedicar academicamente ao problema da consciência se você tiver cabelos brancos e um prêmio Nobel. Mas Crick e Koch colaboraram durante décadas como talvez os principais fisicalistas, investigadores do mínimo substrato neural da consciência, procurando a pineal cartesiana dos tempos modernos (Descartes achava que a glândula pineal fazia a ponte entre a mente pensamento e o cérebro matéria), mas de modo a explicar tudo materialmente é claro. Materialismo, vamos lá! Mas aí me vem Koch em seu último livro dizer que dualismo rocks, mesmo sem cabeleira. Segundo ele a consciência é uma propriedade da matéria, como carga elétrica. Ok, nem é tão ruim, quer dizer, o que significa dizer que elétron tem spin? Que quarks têm cor? Nada, além de dizer: atribuamos uma propriedade x a esta partícula para diferenciar um estado 1 de outro -1 e olha só! agora nosso modelo matemático funciona. Claro, o modelo funcionar quer dizer ser extremamente preditivo em um nível estatisticamente embasbacante então isso deve representar algo sobre o mundo real, físico, afinal, o modelo é perfeito e tal, mas ainda assim, quarks não têm cor. E talvez matéria não tenha consciência. Mas se o modelo que usa essa propriedade fosse preditivo de alguma coisa, aí iríamos achar que toda matéria tem consciência como achamos que tem carga. Koch acha que é, usando a teoria de informação integrada de Giulio Tononi, possível estabelecer um modelo matemático preditivo do grau de consciência de um sistema, mas acho que ele ainda não provou nada, até porque, o sistema de informação com mais capacidade de integração que conhecemos sem contar os cérebros de animais desenvolvidos seria a internet e, segundo Koch, ele acha que ela ainda não é consciente, ainda. E também, se fosse, como diabos saberíamos? Eu não sei se ninguém mais é consciente além de mim, a menos que eu considere consciente tudo o que se comporta como se fosse, quando visto de um ponto de vista externo, o meu, e aí não haveria o Hard Problem porque então bastaria explicar todo esse comportamento "como se fosse" e eu não precisaria achar que saber como é ser eu tenha qualquer relevância para o problema da consciência. E se eu puder fazer isso, aí eu fico com o materialismo mesmo, muito obrigado. Mas Koch acha que existe algo que é como é ser um cachorro, como é ser um morcego, e talvez, como é ser a internet, e, em princípio, como é ser qualquer coisa material porque matéria tem essa propriedade, bastando estar organizada em um sistema integrado de informações para saber como é ser matéria. É um "property dualism" e um panpsiquismo, é praticamente Spinoza back with a vengeance à luz da física moderna.
Qualquer matéria é informação, é verdade, não é? Quer dizer, qualquer diminuição de incerteza, determinação, diminuição de entropia, é definição de informação, na verdade isso é mesmo definição de informação para alguém, que não lembro quem, mas é uma definição formal. Faz sentido, uma partícula informa que existe, no mínimo, mas dizem que informa até se tem spin -1 ou 1, ou se tem cor, ou se é uma corda ou um laço (string vs loop theories), e toda matéria é diminuição de incerteza, de entropia, é um estado qualquer minimamente organizado que pode ser irreversivelmente desfeito. Havendo só energia em fluxo, à máxima velocidade, não há matéria, não há informação, não há espaço e não há tempo. Matéria é desaceleração, é resistência a movimento, F=ma, é paragem (Bergson), é dobra, reentrância, ondulação, é uma ranhura no fluxo incessante de energia do universo e se essa coisinha puder perdurar um pouquinho, só um pouco, um instante, umas centenas de milhõezinhos de anos se tanto, só o tempo suficiente para se organizar em um sistema que integre suas informações, que retenha um pouco de sua história memória, talvez ela possa saber como é que é ser ela.
Mas o hard problem não é o meu maior problema, eu consigo imaginar sem dificuldades uma mente materialista que saiba tudo o que é possível saber sobre como é ser ela sem que isso seja uma outra coisa além da soma de todas as funções do cérebro materialista que a abriga. O que me intriga é essa regressão infinita a alguma instância imaterial que é quem toma decisões. Eu penso meus pensamentos, que são só matéria em movimento dentro do meu cérebro, mas quem é que sabe que eu penso? Quem entende o que eu penso, decide o que eu penso e formula o que eu digo ou escrevo? Todo o processo pelo qual eu penso em algo enquanto estou escrevendo acontece enquanto meu cérebro cuida de todos os movimentos materiais de informações entre neurônios para que eu escreva, meu córtex frontal elabora um plano motor, meu giro pré-central o executa, em perfeita sincronia com receptores proprioceptivos nos meus dedos, mãos, braços, monitorados pelo cerebelo, toda essa orquestra acontece porque eu pensei no que eu queria escrever. Mas um pensamento não pode mover meu cérebro, então um pensamento não pode começar tudo isso, a menos que um pensamento seja só movimento no meu cérebro porque um movimento de matéria pode gerar outro movimento de matéria. Mas se movimento gera movimento, e todo pensamento é matéria, quem começou o primeiro pensamento de uma certa cadeia? Quem foi que decidiu mover meu braço? Eu pensei e ele moveu, mas o pensamento que deu a ordem tem que ser matéria, e antes dele matéria, e então foi um movimento (Bergson chamava de vibração), então foi uma vibração no meu cérebro que começou tudo, e então não fui eu, a menos que eu seja só uma vibração no meu cérebro. Ficar só com o materialismo, que parece tão mais óbvio, requer mudanças radicais em como eu penso como é que é ser eu. Seria preciso imaginar que meu cérebro "pensa", o tempo todo, sem parar, um pandemônio (palavra de fato usada por Dennett) de pensamentos entendidos como vibrações, em resposta aos milhões de vibrações da matéria do mundo físico afetando meus sentidos, vibrando meu cérebro e gerando movimentos, um mar de vibrações que vão competir, moduladas por contexto e mecanismos de adaptação ao meio orientados a algum objetivo todo ele mecanicamente biologicamente determinado, todo esse maremoto afunilado e transformado em uma espécie de fluxo, meu fluxo, o fluxo que sou eu, produto da Joycean Machine. Fluxo de consciência. Parece que volta para o tal fluxo de energia incessantemente propagado desde o Big Bang, desacelerado nessa vibração que é matéria, que quer manter-se, resistir à tendência entrópica de se dissolver, quer continuar existindo e impressionando-se por outras vibrações, companheiras nessa condição de absoluta aberração estatística do universo que é todo estado anti-entrópico, como todo ser vivo. Perceber que somos fluxo é a base para uma teoria da mente, mas também de uma ética. Sistematizá-la, porém, não é trabalho para um exercício de fluxo.

domingo, 9 de setembro de 2012

Educação e a Ética da Virtude

Recentemente eu me meti a escrever dois textos sobre educação, tentando dar forma a algumas reflexões que venho tendo como pai de primeira viagem. Embora tenham sido, realmente, sobre educação, eles também eram textos sobre um outro assunto, que ficou subjacente, e que é realmente o tema que mais tem me interessado, tanto pessoal quanto profissionalmente: ambos eram textos sobre ética. Mais especificamente, sobre uma forma de se pensar a ética que tem sido chamada de ética da virtude.
 
No último texto, sobre palmadas, eu falei de duas formas de se julgar o valor moral de uma ação. A forma utilitarista, ou consequencialista, vai julgar se a palmada é boa ou não com base nas consequências que ela gera. E a forma deontológica vai se preocupar com algum princípio moral, uma regra de conduta. Por praticamente dois séculos a discussão moral foi polarizada por essas duas vertentes, porque elas permitem argumentos bem objetivos. O utilitarismo chega a quantificar matematicamente, fazer gráficos, que medem as consequências positivas versus as negativas e com isso aprova ou não a legitimidade moral de uma conduta.
 
Mas que outra opção temos, além de avaliar a moral por regras ou por consequências? A ética da virtude irá propor uma terceira via, ao dizer que devemos avaliar o caráter de uma ação pelo caráter do agente. Uma boa ação é aquela praticada por um homem bom. Uma ação justa é aquela praticada por um homem justo. Parece estranho? Parece um pouco. Mas vejamos o que isso significa na prática.

 
 Eu apanhei de meus pais. Eu e minhas irmãs, quando nos comportávamos mal, éramos devidamente colocados de bruços sobre as pernas de minha mãe e recebíamos sonoras chineladas na bunda. Éramos três, e nos momentos de maior agitação ou confusão, também levávamos boas palmadas menos sistemáticas. Eu me lembro que estava já na faculdade quando ouvi pela primeira vez uma discussão mais formal sobre uma possível lei para abolir as palmadas e achei aquilo um absurdo. Por que proibir? Eu apanhei minha infância toda e nunca senti que aquilo tivesse sido um problema, nem remotamente. Pelo contrário, tive sempre uma impressão tão boa de meus pais, de minha família e da minha infância, que a idéia de que a forma como eu fui criado pudesse ser considerada ilegal me pareceu uma afronta. Outras pessoas, porém, nunca apanharam de seus pais e consideravam o ato alguma coisa de hediondo. E outras ainda, apanharam de seus pais e sentiam-se traumatizadas por isso, ou ao menos prefeririam que tivessem sido tratadas de outra maneira. Quando a discussão vai a público, e pretende-se formular uma lei, ela passa a ser colocada de forma objetiva. Queremos um parâmetro claro, científico, que diga o que é certo ou errado. Queremos avaliar a ação por alguma regra clara, ou por consequências mensuráveis. Mas algumas questões são propriamente questões morais, e deveriam ser colocadas em termos de valores, não de fatos. Como é possível que eu tenha apanhado de meus pais e me sinta tão bem educado por eles, enquanto outros se sentem tão mal por isso? Como achar a regra clara ou a medida absoluta das consequências, que compatibilize vivências tão diferentes?
 
Segundo a ética da virtude, uma boa educação é aquela levada a cabo por um pai ou uma mãe que sejam bons educadores, ou seja, que tenham a virtude de saber educar. Bater nos filhos pode, ou não, fazer parte de uma boa educação, mas isso não depende de uma regra absoluta, nem de consequências mensuráveis. Depende do caráter do educador. Bons educadores, pais virtuosos, não se submetem a uma regra maior que eles mesmos, nem ficam avaliando consequências, embora possam fazê-lo quando lhes parecer apropriado. Pais virtuosos o são em todas as suas ações, pois essa virtude impregna-lhes o caráter. Eles se interessam por educação, e emocionam-se ao educar seus filhos. Reconhecem essa virtude em outras crianças e em outros pais, e esse reconhecimento é bom, é alegre, une-os em torno de um mesmo ideal, mesmo que discordem em alguns valores individuais. Prestam atenção em educação, em seus filhos, e em seus valores. Vêem-se naturalmente interessados em reportagens, livros ou comentários que ouçam a respeito do tema. Seus ânimos, suas disposições, voltam-se para esses temas como uma pedra se volta para o chão. Percebem quando agem bem, pois se sentem tomados de alegria, e não há lei, regra ou medida no mundo que possa fazê-los se desviar daquilo que sentem, com todas as forças, que é a ação em conformidade com a virtude, que é a boa educação.
 
 
Mas como saber? Como ser um bom educador? Bem, ninguém nasce virtuoso. Na forma mais clássica de ética da virtude, que é basicamente a ética de Aristóteles, existe o conceito, do grego, de "phronesis", uma espécie de sabedoria prática, a capacidade de reconhecer em cada situação qual a maneira correta de agir. Esta sabedoria se adquire, se desenvolve na prática, através da experiência e da convivência com a sociedade. Pensar por esse molde da ética da virtude não é uma espécie de garantia contra o erro. Se a boa educação é aquela provida por um bom educador, poder-se-ia entender que qualquer coisa que este fizer será sempre acertada. Não é assim. A idéia é que exista uma forma ideal da boa educação, e o bom educador é aquele se pauta por ela. Ele pode errar. Talvez a palmada não devesse fazer parte de uma boa educação, mas não é por bater ou não que se define o caráter do bom educador. Talvez haja momentos em que bater seja adequado, e momentos em que não, mas a angústia de saber distingui-los não deveria ser resolvida por uma regra pré-definida, uma receita de bolo, ou por qualquer critério que tire da jogada aquele que é o critério mais importante, mais fundamental: a sabedoria e a disposição para a virtude do educador.

 
 A ética da virtude vem experimentando um ressurgimento nos últimos cinqüenta anos, mais ou menos. Este ocorreu em grande parte como uma reação à forma cada vez mais fria, rígida, objetiva e pretensamente científica que a filosofia moral vinha colocando seus problemas. Essa reação vem ganhando força e influência, mas ainda é relativamente recente. Muitas particularidades desse pensamento ainda não foram suficientemente aprofundadas, e alguns de seus problemas ainda não foram satisfatoriamente endereçados.

 
Após séculos relegadas a segundo plano, temos dificuldade para encontrar um espaço para as virtudes em nossa sensibilidade contemporânea. Devemos criar nossos filhos para serem virtuosos, ou seja, segundo essa ótica, para terem uma disposição para agir bem e uma sabedoria prática para nortear suas ações. Mas que virtudes devemos ensinar? Honestidade? Lealdade? Temperança? Fraternidade? Coragem? São muitas as virtudes clássicas, mas sabemos como elas entram e saem de moda, tornam-se mais ou menos relevantes, e é difícil assumi-las como verdades atemporais. Por exemplo, há cinquenta anos atrás um funcionário leal com décadas de empresa era valorizado, enquanto hoje um jovem que passe dois anos em uma mesma empresa começa a parecer um acomodado. Lealdade e experiência eram virtudes muito importantes, mas hoje, agilidade e ambição são mais. No Texas, a coragem para defender sua família de um assaltante com uma arma é uma virtude. No Brasil, é uma idiotice. Aquilo que aprendemos como virtude e sabedoria prática muda demais, com o tempo e a sociedade em questão, e foi esse exatamente o apelo que levou o utilitarismo a se tornar tão influente, por propor uma forma objetiva de distinguir certo e errado.

 
 Ainda não há uma resposta exata para essas questões. Não temos como saber quais virtudes devemos ensinar, quais valores especificamente devemos sempre defender. Mas também não podemos nos deixar cair em um relativismo total em que o bom é aquilo que a cada um lhe parece. A palavra grega para virtude é "areté", que quer dizer, mais precisamente, excelência. A questão que se põe, para a educação e para a ética da virtude, é: o que constitui a excelência do ser humano? O que significa viver de acordo com a virtude, ou seja, viver de forma a expressar ao máximo a essência do homem e da humanidade? Pode ser que não conheçamos uma resposta absoluta para essa questão, pode ser que ela não exista. Mas podemos sentir, em nós, e em nossa disposição para a vida prática, algo que reconhecemos como bom. E não há nada mais importante que possamos fazer por nossos filhos que ensinar isso a eles. Torná-los tão capazes quanto nós, mesmo que sejamos ainda tão incapazes, de perseguir a virtude.

 
Por isso eu disse no primeiro texto: para educar bem, eduque-se. Torne-se uma pessoa melhor, mais sábia e mais virtuosa. Preocupe-se em desenvolver essa virtude, essa disposição de ânimo, de inspirar-se pela educação. Você vai perceber que educar é um processo contínuo e bilateral, pois você tem tanto a aprender quanto seu filho, e ambos estão, essencialmente, aprendendo a mesma coisa. Nada se compara à alegria de descobrir-se cada vez menos um professor, e cada vez mais um companheiro de seu filho nessa aventura de se tornar um ser humano melhor.




quinta-feira, 26 de julho de 2012

Castigos, palmadas, e um pouco de moralismo

Nos últimos dias vi-me novamente empenhado em um debate com minha esposa sobre educação. Dessa vez não fomos inspirados por nenhuma reportagem, mas enfim, como pais de primeira viagem que somos, o assunto vive recorrendo. Desta vez o tema era o castigo físico como medida educativa.
Eu e minha mulher conversamos muito, tentando explorar o que nós mesmos pensamos sobre o assunto. Para ela, foi fácil afirmar que gostaria de educar nossa filha sem palmadas. Mas ela humildemente admitiu que nossas experiências até agora, com uma bebê de um ano, não nos permitem prever as situações mais extremas com que poderemos nos deparar, e exatamente como reagiríamos. Por exemplo, se uma criança de dois a três anos de repente sai correndo para o meio da rua. Nessa idade uma criança não é muito capaz de compreender a gravidade do que fez só por uma conversa. Haveria outra alternativa tão eficaz quanto uma palmada para deixar claro que ela nunca mais deveria fazer aquilo?

O caminho que percorremos para chegar a uma possível resposta mostrou-se uma boa oportunidade para exemplificar os dois instrumentos que considerei essenciais aos pais para uma boa educação no meu último texto: (1) Clareza dos seus valores morais e (2) Noções de desenvolvimento psicossocial infantil.

Comecemos então pela questão de valores. O que você pensa sobre a palmada? É certo, bom, ou ao menos justificável bater nos filhos no contexto educativo? Notem que aqui não estamos falando de agressão física gratuita, nem gravemente violenta, mas da famosa palmada educativa. E também não vale uma reposta do tipo "depende da situação", por que isso é óbvio, uma vez que ninguém advoga palmadas a torto e a direito por qualquer coisa. A questão é: existe alguma justificativa moral para a palmada em alguma situação?

Eu vou tentar chegar a uma resposta, mas será, é claro, a minha reposta. O objetivo deste texto, porém, não é dar receita de bolo, mas mostrar o valioso instrumento que é desenvolver a clareza de seus valores morais.

Para começar a pensar sobre valores, sugiro que façamos uma divisão bem básica entre duas visões éticas:
A primeira, conhecida por ética utilitarista, consiste na idéia de que nosso julgamento sobre o valor moral de uma ação depende das consequências dela. Ou seja, a palmada poderia ser justificada se ela resultar em algo bom. Quando perguntamos se a agressão física pode ou não resultar em um trauma para a criança, estamos pensando segundo essa ética utilitarista. Estamos pressupondo que se a palmada não trouxer consequências negativas maiores do que o benefício de ensinar um comportamento desejável, então ela pode ser empregada.
A outra forma básica de se pensar sobre valores é a ética deontológica. O nome difícil esconde uma idéia simples: trata-se de atrelar o valor moral de uma ação ao motivo dela, não importando a consequência. Ou, melhor dizendo, de julgar o caráter de uma ação por um princípio moral, uma espécie de regra sobre o que é certo ou errado independente do resultado desta ação. Este tipo de pensamento anda meio fora de moda. No mundo moderno olhamos com desconfiança para a idéia de um gabarito moral, de um princípio ético básico, porque vivemos em um mundo pluralista aberto a diferentes interpretações de valores.

E você, o que acha? Ao decidir se vale ou não lançar mão da palmada na educação de seus filhos, você acha que o faz por uma questão utilitarista (se faz mais bem ou mais mal), ou por uma questão de princípios?

As discussões que vemos a respeito desse tema costumam levar sempre em conta uma ótica utilitarista. Discute-se se a palmada vai causar traumas, se vai ensinar o uso da violência, ou se é, afinal, eficaz. Para alguns pais, porém, pode ser que não importe se é eficaz ou se traumatiza. Para alguns isso pode ser algo considerado simplesmente errado, por um valor moral.
Vivemos em uma sociedade avessa à discussão nestes termos. Achamos que apelar para um princípio moral pode parecer desrespeitoso, intrusivo. Em um debate público, seja em uma conversa entre amigos, fórum de internet ou programa de televisão, queremos sempre evitar parecer moralistas, e por isso imperam as discussões utilitaristas. Tem vantagem? É eficaz? Faz mal?

Talvez seja bom que isso funcione assim nos debate públicos, mas com certeza não é bom que isso funcione assim na sua casa, na sua vida pessoal, e na educação dos seus filhos. Para você e para sua família, deve valer aquilo que lhe faz sentido, e você deve considerar essas questões da forma que lhe parecer a mais correta. Se for a utilitarista, leve os dados sobre as consequências em conta e decida como educar. Agora, se você pensa de forma deontológica, leve as discussões públicas em conta, é claro, mas não tenha medo de validar os seus próprios princípios morais, e viver e educar seus filhos de acordo com eles.

Como eu resolvi a questão para mim? Bom, entre essas duas formas básicas de se pensar sobre valores há inúmeros tons de cinza, e ainda há outra formas, entre as quais se encontra a que eu mais me identifico. Mas, para tentar me ater a essas duas, eu aproximaria a minha forma de pensar à ética deontológica, pois há um certo princípio básico que norteia minhas decisões morais, na minha vida e na educação de minha filha. Esse princípio vem atrelado a uma idéia, ou ideal, de ser humano: acho que o ser humano é tão mais feliz, mais completo, e em certo sentido vive uma vida tão melhor quanto mais potência de ação ele tem. Acho que a palmada ensina que algo não deve ser feito em hipótese nenhuma, a ponto de justificar o uso de violência para coibir, efetivamente traçando um claro limite no repertório de ações da criança. Acho que outras formas de educar podem ensinar à criança que ela não deve decidir por certas atitudes, fornecendo parâmetros de ação, e não limites.

É claro que eu quero que minha filha aprenda a jamais correr para o meio da rua. O ponto é que eu vejo uma diferença entre uma criança, ou qualquer ser humano, que sinta que uma ação lhe é absolutamente proibida, e um ser humano que sinta que escolhe não realizar uma certa ação absolutamente. Veja que não se trata de uma diferença utilitarista, uma vez que o resultado de qualquer intervenção eficaz nesse caso é o mesmo: a criança não correrá para a rua. A diferença é que, por princípio, eu atribuo um valor moral mais alto a uma conduta que respeita ao máximo a potência de ação de cada indivíduo, que a uma que diminua essa potência.

Essa distinção entre limites e parâmetros pode parecer uma sutileza desprezível. Mas, para mim, a cada momento ao longo de toda a sua existência, quando um ser humano sente que uma ação está além de seus limites ele se entristece e se diminui como pessoa. E a cada momento que um ser humano decide que uma ação está descartada por não corresponder aos parâmetros que ele aprendeu a traçar para si mesmo como um ser moral, ele se reafirma, e é mais feliz. Por isso, para mim, essa distinção é fundamental. Para mim. Para você pode ser diferente, e isso não é nenhum problema. Como eu já disse antes, só você pode saber o que é importante na educação de seu filho, mas você tem que saber.

Agora, se eu continuar essa discussão assumindo que, por princípio, não vamos empregar a palmada, então como ensinar para uma criança de 3 anos, por exemplo, que ela não deve correr para a rua? Aqui entramos no segundo instrumento: as noções de desenvolvimento psicossocial infantil.

É comum ouvirmos que crianças, principalmente as pequenas, precisam de limites. A idéia é que enquanto elas ainda não têm a capacidade de desenvolver um senso moral autônomo, ou o discernimento para se comprometer com algumas condutas, a única coisa que pode fazê-las aprender o que é errado é isto ser apresentado como absolutamente proibido. E isso está certo em grande medida. Não dá para conversar com uma criança de três anos, como é possível fazer com um adolescente, para mostrar que uma conduta é possível, mas não correta. Crianças menores devem aprender simplesmente que algo não deve ser feito, e pronto. Será que ainda assim vale a distinção entre limite e parâmetro que usei para condenar a palmada? Se a criança é tão pequena que ainda não dá para apelar ao seu senso moral, então um castigo mais duro e a imposição de um limite, mesmo que violento, não é inevitável? Ou ainda, melhor dizendo, mesmo que a palmada não seja inevitável, mas será que ela é realmente diferente de qualquer outra forma de impor um limite, já que ele terá que ser coercivo de qualquer forma?

O que nos permite chegar a uma resposta a essa pergunta é esse segundo instrumento, o desenvolvimento infantil. Quando estudamos crianças, e como elas se desenvolvem, descobrimos coisas fascinantes. Descobrimos, por exemplo, que crianças têm, sim, um senso de certo e errado, um senso moral. Ele só é muito diferente, é claro, do que o de um adulto, mas ele está lá. Se um adulto pode decidir sobre o que é certo ou errado com base em complexos e abstratos parâmetros morais, e um adolescente pode ser ensinado a pensar moralmente por si próprio, uma criança de qualquer idade também pode, desde que compreendamos qual é a "linguagem moral" de que ela é capaz.

Há diversas teorias sobre o desenvolvimento infantil, e eu não tenho pudores em me apropriar daquela que me parece mais útil em determinado momento. Nesse caso, gostaria de usar a teoria de Erik Erikson, um estudioso de orientação psicanalítica que expandiu grandemente o trabalho de Freud sobre o tema. Erikson sugeriu que o desenvolvimento humano possa ser dividido em oito fases, e que cada uma delas se caracterizaria por nossos esforços para resolver um grande conflito. Por exemplo, para uma criança entre um ano e meio e três anos, o conflito é entre autonomia e vergonha. Ela sente que é capaz de fazer mais coisas sozinhas, aprendeu a andar por sua própria conta e quer explorar o mundo. O que a limita é o medo de se envergonhar ao fazer algo errado e decepcionar os pais. Nesse embrião de senso moral, bom é descobrir uma nova ação bem recebida, e mal é passar vergonha, por uma reprovação dos pais.

Ou seja, quem acha que pode conversar sem precisar bater em seu filho adolescente para educá-lo, também pode fazê-lo com seu filho de três anos. Basta usar o que ele entende por bom e mal. Ele pode desde muito cedo passar pela experiência de decidir por si mesmo que não deve correr para a rua, mas ele não decidirá corretamente porque é perigoso, ou porque é errado, mas porque seus pais se decepcionarão com ele. Ele também decidirá corretamente se aprender que o resultado dessa ação é levar uma palmada, mas aí ele não passará pela experiência de que foi ele que decidiu não fazer isso com base no seu senso moral. Passará apenas pela experiência de que não teve opção.

Essa idéia pode parecer meio estranha. Ao invés de palmadas, garantir que ele sinta vergonha do que fez? Será que isso é realmente melhor? Explorar a vergonha não pode ser ainda mais traumático, ou talvez até mais errado, do que uma palmadinha?

Bem, em primeiro lugar, a palmada também é muito vexatória. Mas mais do que isso, embora pareça estranho, evocar essa sensação de vergonha não é diferente de evocar qualquer outro parâmetro que se queira para justificar a moralidade de uma conduta. Ao longo do desenvolvimento vamos aprendendo a agregar outros parâmetros além da vergonha, como culpa, solidariedade, amor, respeito, justiça, e nosso senso moral vai ficando mais complexo. A própria vergonha nunca deixa de fazer parte dos parâmetros que nos movem agir da forma que achamos certa. Para uma criança de três anos, porém, ela é, talvez, o único parâmetro acessível. E ainda, se pensarmos bem, isso é o que acontece nessa mesma fase no treinamento de toalete. Você pode bater o papo cabeça que quiser para convencer seu filho a fazer suas necessidades na cadeirinha, mas a verdade é que a motivação que ele tem para obedecer é a vontade de corresponder à expectativa que você tem dele, e não se envergonhar ao decepcioná-lo.

É claro que explorar a vergonha não significa humilhar a criança. Trocar a agressão física pela verbal não resolve grande coisa. Uma criança nessa fase deve ter confiança suficiente no vinculo com os pais para compreender que decepcioná-los é muito ruim a ponto de moldar suas condutas, mas não a ponto de ameaçar esse vínculo. Isso, se continuarmos a usar a teoria de Erikson, é possível porque a fase anterior, do nascimento aos 18 meses, é marcada pelo conflito confiança básica versus desconfiança. Ou seja, garantindo que essa primeira fase seja bem resolvida, e que a criança se sinta confiante, amada e protegida pelos pais, ela pode depois ser exposta a um conflito moral como sentir-se envergonhada por uma má conduta sem que isso se torne traumático. É incrível, mas uma criança de dois anos, bem amada e bem cuidada, já é capaz de começar a desenvolver uma percepção de si mesma como um ser moral autônomo, algo que muitos adultos parecem incapazes de fazer.

Esse é o valor, inestimável, de uma boa educação.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Como educar seus filhos?

Na última semana a revista Veja São Paulo publicou uma matéria sobre como educar filhos. Eu, como pai de uma menininha de um ano, li com muito interesse. Como psiquiatra que trabalha há anos com adolescentes, li com desconfiança. Por melhores intenções que se tenha, esse é um tema espinhoso para escrever a respeito, e mesmo as sumidades dessa área estão longe de serem unanimidade. Minha mulher, também mãe de primeira viagem dessa nossa pequena, participa ativamente de um blog e grupo de discussão sobre a maternidade, o excelente Conselhos de Mãe. Ela se decepcionou com a reportagem, e disse que a impressão geral das mães do grupo foi a de que a revista perdeu uma grande oportunidade de abordar mais profundamente o tema. A reportagem parece um manual de receitas de bolo, uma coleção de dicas genéricas. Em defesa da reportagem, reitero, é um tema espinhoso, difícil de acertar. E agora que me meti aqui a escrever a respeito, fico cada vez mais convencido disso.

Mas, já que me arrisquei, vamos lá. Está na hora de dar a cara a tapa e responder sem rodeios à pergunta que ficou tão insatisfatoriamente mal respondida na reportagem da Veja. Como educar seu filho?

Resposta: Educando-se. Eduque-se primeiro, e você vai educar bem seu filho.

Ufa! Muito bem, uma vez que isso está fora do caminho, reposta curta e grossa dada, vamos então conversar a respeito. Para começar, o que significa educar seu filho? Vai ser difícil falarmos sobre isso sem saber se estamos realmente preocupados com a mesma coisa. Há várias interpretações para "educar seu filho", e eu não pretendo ser exaustivo, mas vou citar algumas coisas que acredito que façam parte desse pacote:
1. Ensinar o que é certo e o que é errado;
2. Ensinar o que é bom e o que é mau;
3. Criá-lo de forma a ser uma pessoa feliz.

Antes de prosseguir, acho que vale a pena dedicar algumas palavras à diferença entre os dois primeiros ítens, que nem sempre fica clara de imediato. Por exemplo, ao descobrir que seu filho adolescente anda fumando maconha, isso merece uma conversa sobre o que é certo e errado, ou uma conversa sobre o que é bom e mau, ou as duas? Essa é uma questão encarada de forma tão diferente por tantas pessoas, que fica difícil tomar qualquer postura como base para começar. Mas, talvez, possamos começar dizendo que, pelo menos até que a lei mude, fumar maconha é errado, sem muita discussão, ficando então a ser definido em uma conversa franca se isso é ou não bom. Mas desse ponto de partida já começam a surgir dúvidas: Só porque a lei diz que não pode, disso se pode concluir que é errado? É bom para uma pessoa aceitar como certo aquilo que a lei diz que é certo, ou é melhor contestar? E essa resposta muda se a pessoa for um adulto ou um adolescente?

Sem responder a essas perguntas, permitam-me voltar aos três ítens que propus como constituintes de uma boa educação e perguntar: você sabe a reposta para essas coisas que devemos ensinar a nossos filhos? Você sabe a diferença entre bom e mau, e entre certo e errado, e sabe como ser uma pessoa feliz?

Percebe? Eduque-se primeiro, para poder educar bem seu filho. Se você nunca parar para se perguntar, para você e para a sua vida, sobre essas questões, dificilmente vai conseguir passar para seus filhos a educação que gostaria.

Centenas, ou milhares, de livros foram escritos sobre educação de filhos, e sobre essas questões de certo, bom e feliz. Por isso, não se preocupe, não vou tentar resolver essas questões nesse texto, que eu tenho certeza que você espera que seja uma leitura rápida. Mas pretendo ao menos desviar o foco da questão, que na reportagem ficou nas dicas genéricas, para o que considero realmente o cerne desse tema: não dá para educar bem um filho, sem ter clareza dos seus valores.

Vivemos uma era muito interessante, em que nunca na história, talvez, a sociedade humana foi tão complexa e tão complexamente modificada em tão pouco tempo. São tempos que já foram classificados por tantos nomes, e todos eles corretos: hedonismo, globalização, rapidez e fluidez, rejeição às tradições, consumismo, pulverização, imediatismo. Tudo isso faz parte, mesmo, do nosso mundo moderno. Estamos desacostumados a pensar sobre questões morais, como bom e mau, porque estamos o tempo todo em contato com novidades, com outras culturas, com ideais de liberdade e aceitação das diferenças. Desenvolvemos uma espécie de "consciência global" que facilmente detecta vilões estereotipados, mas que raramente nos pede para desenvolvermos uma profunda "consciência interna" de certo e errado. Às vezes achamos que temos uma idéia muito clara de nossos valores, mas só porque seguimos algo que aprendemos, e não sabemos mais ensinar a uma criança, ou adolescente, que nos conteste, as razões desses valores. Temos, muito mais claramente do que uma noção de bom e mau, uma noção de normal. Queremos viver a vida que todos estão vivendo e que nos é apresentada como boa. Queremos seguir nossas vidas e ser felizes, sem maiores preocupações. Mas aí vemos que "as crianças estão cada vez mais impossíveis", "ninguém respeita mais o professor", "as drogas estão em todo lugar e podem pegar seu filho a qualquer momento", "todos estão transando como coelhos", e achamos que isso, também, passou a ser normal. Nos desesperamos pois tudo o que é normal é tudo o que queremos, e o normal tem sido assustador nesse "mundo louco" de hoje em dia. O mundo não está louco. Loucos estão os que acham que basta ir levando a vida para ser "normal e feliz".

Aprender a desenvolver uma noção ética e moral que nos torne prontos para a vida na sociedade moderna é tarefa dificílima, mas fundamental para educar nossos filhos. Infelizmente, além de difícil também não é suficiente. Devemos também conhecer ao menos um pouco de psicologia infantil. Temos que saber como nossos filhos pensam, lidam com sentimentos e relacionam-se com adultos e com seus pares, ao longo das várias fases do desenvolvimento pela qual ele passa. Não adianta esperar de uma criança de 8 anos que tenha a capacidade de compreender questões abstratas como bom e mau da mesma forma que um adolescente de 17 anos consegue. E também não adianta esperar de um adolescente de 17 anos, que engana tão bem ao parecer que pensa e compreende o mundo da mesma forma que um adulto, que tenha o mesmo discernimento de um, porque não é verdade que eles pensem de forma parecida. Além de saber o quê ensinar, temos que saber também como ensinar, e o que nossos filhos serão capazes de aprender em cada fase.

Isso não é fácil, e fica mais difícil ainda pelo fato de que nossos conhecimentos sobre o desenvolvimento infantil ficam desatualizados tão rápido quando tecnologia de telefonia móvel. As gerações "digitais" são mais diferentes de nós do que os hippies eram de seus pais nos anos 60, e nós não temos nem idéia do impacto que isso ainda vai ter no mundo. Mas não acho que isso deva nos desanimar. Na verdade, sinto que é um momento excitante, cheio de novidades, e povoado por criaturinhas que vão nos surpreender de formas absolutamente inimagináveis. Só precisamos, é claro, e mais do que nunca, estar preparados.

Para isso, não tem segredo, nem receita. Nem caminho fácil, e nem difícil. Só tem um jeito: ter conhecimento, amor, dedicação, e conhecer seu filho. Saber como ele é, e como pode ser. Saber o que você quer, e o que ele pode. Estar junto, aberto, seguro, e determinado. A quê? A ensiná-lo com firmeza ou leniência? Com rigidez ou com liberdade? Com limites claros ou com parâmetros construídos? Com fé ou com razão?
Só você pode saber. A questão é que você TEM que saber.


Poxa! Mas não eu não sou filósofo nem psicólogo. Não dá pra educar bem meu filho sem ter que estudar tudo isso, sem me reeducar, sem gastar tanto tempo e tanto tutano?

Claro que dá. É só seguir receita de bolo.